VELOCIDADE DA VIDA
Psicanalista faz elogio do ócio
No Fronteiras do Pensamento, Maria Rita Kehl propõe uso do tempo para atacar depressão
Maria Rita Kehl voou do aeroporto para uma entrevista coletiva, passou rapidamente na bienal e, dali, foi à conferência que proferiu ontem como parte do ciclo de altos estudos Fronteiras Braskem do Pensamento. Sem desacelerar, a psicanalista e escritora discursou, no Salão de Atos da UFRGS, sobre a velocidade do mundo contemporâneo, considerada por ela uma das causas do aumento de casos de depressão verificado atualmente.
– A época em que vivemos é claramente antidepressiva: temos mais liberdade, opções de entretenimento e estímulos ao que, em psicanálise, costumamos chamar de gozo. É justamente pelas dificuldades de lidar com tudo isso que a época em que vivemos, paradoxalmente, também pode ser considerada claramente depressiva – disse.
Autora do recente O Tempo e o Cão: A Atualidade das Depressões (Boitempo Editorial), Maria Rita acredita que os prazeres fugazes, por serem mais efêmeros e, consequentemente, mais rasos, produzem ao mesmo tempo satisfação e insatisfação – inclusive, e sobretudo, nos jovens.
– A adolescência e a juventude, de uma forma geral, já são, por princípio, nossas fases mais críticas. A incapacidade de responder aos estímulos, aliada à cobrança por um certo alinhamento com determinados padrões culturais e até mesmo estéticos, acaba se potencializando nesse caso. Os meninos e as meninas querem o prazer, mas são inseguros, têm os seus temores. Quando não acompanham o restante da turma, mesmo em se tratando de algo insignificante, já se pode dizer que estão estabelecidos motivos para um mal-estar. Não é à toa que a prática de bullying é muito frequente hoje em dia – analisa a especialista.
Tradicional simpatizante de movimentos sociais como o MST, ela também fez uma interessante relação da depressão como a face mais evidente desse mal-estar contemporâneo e, também, como termo usado pelos especialistas em economia.
– Ambas as situações têm a ver com a desaceleração, do crescimento econômico-financeiro no segundo caso e de uma inadequação à velocidade do mundo atual no primeiro. Esse paralelo não está posto por acaso – explicou.
Seria essa desaceleração, acrescentou, um caminho possível para combater o mal-estar – até mesmo quando ele não se manifesta em forma de uma depressão diagnosticada como tal, e sim como uma tristeza passageira, corriqueira.
– É importante recuperar o valor do tempo. É algo de que precisamos com a maior urgência hoje: tempo.
daniel.feix@zerohora.com.br
Cifras Graves |
- Dados da Organização Mundial da Saúde indicam que a depressão, no início dos anos 2000, acometia 6% da população mundial. |
- Até 2020, a depressão deverá ser a segunda maior causa de mortandade no mundo, atrás apenas das doenças cardíacas, aponta a OMS. |
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