Havia mais terrenos baldios e menos canais de televisão. Mais cachorros vadios e menos carros na rua. Havia carroças na rua. E carroceiros fazendo o pregão dos legumes. E mascates batendo de porta em porta. E mendigos pedindo pão velho.
A Velha (ou o Velho) do Saco assustava as crianças. O saco era de estopa. Não havia sacos plásticos, levávamos sacolas de palha para o supermercado. E cascos vazios para trocar por garrafas cheias. Refrigerante era caro. Só tomávamos no fim de semana. As latas de cerveja eram de lata mesmo, não eram de alumínio. Leite vinha num saco. Ou então o leiteiro entregava em casa, em garrafas de vidro. Cozinhava-se com banha de porco. Toda dona-de-casa tinha uma lata de banha debaixo da pia. E ninguém tinha problemas com colesterol.
O barbeador era de metal e a lâmina era trocada de vez em quando. Mas só a lâmina. As camas tinham suporte para mosquiteiro. As casas tinham quintais. Os quintais tinham sempre uma laranjeira, ou uma pereira, ou um pessegueiro. Comíamos fruta no pé. Minha vó tinha fogão a lenha e compotas caseiras abarrotando a despensa. E chimia de abóbora, e uvada, e pão de casa.
Meu pai tinha um amigo que fumava palheiro. Era comum fumar palheiro na cidade; tinha-se mais tempo para picar fumo. Fumo vinha em rolo e cheirava bem. O café passava pelo coador de pano. As ruas cheiravam a café. Chaleira apitava. O que há com as chaleiras de hoje que não apitam? As lojas de discos vendiam long plays e fitas K7. Supimpa era ter um três-em-um: toca-disco, toca-fita e rádio AM (não havia FM). Dizia-se “supimpa”, que significa “bacana”. Pois é, dizia-se “bacana”, saca? Os telefones tinham disco. Discava-se para alguém. Depois, punha-se o aparelho no gancho. Telefone tinha gancho. E fio.
As roupas eram lavadas no tanque, a mão, e penduradas na cerca, nos pátios das casas para secar. Não havia máquinas de lavar. O ferro era com água quente. Não havia ferro elétrico ou a vapor. Também não havia cafeteiras. O almoço e a janta eram feitos no fogão, em grandes panelas. Não havia microondas para esquentar o congelado em 15 segundos.
As mães e avós tinham tempo para cozinhar, lavar, limpar, varrer, e ainda fazer bolos à tarde e contar histórias. Bordavam, costuravam e conversavam na venda com as vizinhas, enquanto anotavam o valor das compras em um caderno. Não havia cartões de crédito e as pessoas se conheciam.
Se o seu filho estivesse no quarto dele e você no seu escritório, você dava um berro pra chamar o guri, em vez de mandar um e-mail ou um recado pelo MSN. Estou falando de outro milênio, é verdade. Mas o século passado foi ontem! Isso tudo acontecia há apenas 20 ou 25 anos, não mais do que o espaço de uma geração. A vida ficou muito melhor. Tudo era mais demorado, mais difícil, mais trabalhoso. Então por que engolimos o almoço? Então por que estamos sempre atrasados? Então por que ninguém mais bota cadeiras na calçada? Por que temos toda essa pressa constante?
Alguém pode me explicar onde foi parar o tempo que ganhamos?
( autor desconhecido )
Colaboração por e-mail, de Luciana Hahn Brum.
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